Astaroth é um espírito do Grimório Verdadeiro, e um dos três
chefes dos espíritos. No sistema do Grimório Verdadeiro, Astaroth compartilha o
domínio sobre o mundo com Lúcifer e Belzebuth. Nesta divisão, Lúcifer governa
Europa e Ásia, Belzebuth, África, e Astaroth, as Américas. Nos sistemas
supostamente tradicionais de demonologia, Astaroth é muitas vezes vista como um
ser masculino. Isto é algo que será discutido posteriormente. Para nossos
propósitos imediatos, Astaroth é considerada como similar à, se não idêntica
com, uma deusa dos pagãos canaanitas e outros, conhecida como Astarte, e
associada com Vênus e a Lua.
Esta não é
necessariamente uma contradição dos grimórios, que são remanescentes de magia
mais antiga, bem como sistemas por sua própria conta. Eles são, por definição,
incompletos, e melhor compreensão requer pesquisa, paciência e experiência.
Apesar de seus defeitos, e suas imprecisões frequentes, é insensato fazer
mudanças sem primeiro obter esta compreensão e experiência. Fazer isso pode piorar
os resultados, ao invés de melhorá-los. A diferença entre os grimórios e a
abordagem descrita aqui é uma consequência da natureza mais pessoal e
individual dos espíritos, já que eles são confrontados nesta maneira de
operação. É também um resultado da correspondência desta abordagem à magia, já
que ela existia muito tempo antes do período medieval.
Astaroth tem como
seus agentes no Grimório Verdadeiro os espíritos Sargatanas e Nebiros, que por
sua vez governam sobre muitos espíritos, particularmente Nebiros. À parte estas
importantes relações hierárquicas, Astaroth tem uma afinidade com um, e somente
um, dos espíritos do Grimório Verdadeiro. Esta afinidade é com o próprio
Imperador Lúcifer, e nenhum outro espírito tem tal afinidade. Como com as afinidades,
outros espíritos do Verdadeiro Grimório tem, um com o outro. Esta afinidade não
é de posição, mas de espíritos parentes. Assim como uma relação entre
Comandantes é uma afinidade importante, e uma com muitas consequências e
implicações.
Embora Lúcifer seja o
governador máximo de todos os espíritos, e seja raramente evocado diretamente,
a afinidade de Astaroth com ele, junto com sua própria importante posição, faz
dela a Comandante ideal para com os magistas trabalharem. Astaroth é de longe a
mais abordável dos três Chefes, e o magista que trabalha com ela encontrará sua
afinidade com o Imperador uma qualidade muito útil. Junto com o relacionamento
com Scirlin, que todo magista trabalhando com o Grimório Verdadeiro deve ter,
uma relação com Astaroth tem para trazer o favor de Lúcifer para com o magista.
Além disso, a afinidade com esses chefes pode conferir sobre o magista muitos
dos benefícios que Lúcifer concederia. Isto está em contraste distinto ao
trabalhar com Belzebuth, que é mais duro por natureza, e menos perdoador de
falhas no procedimento ritual.
Os Poderes de
Astaroth
De acordo com o
Grimório de Honório, Astaroth confere o favor do grande e poderoso, e isto está
de acordo com sua associação com a estrela Sírius, que também confere outros
tesouros associados com ela em tempos antigos. De acordo com Weyer, Scot e a
Goetia, Astaroth pode responder verdadeiramente em relação à todas as questões passadas,
presentes e futuras, e de todos os segredos. De acordo com o Grimório de
Armadel, e confirmado em menos detalhes pelos três acima mencionados, Astaroth
também pode revelar todas as questões em relação à Queda dos Anjos, incluindo
sua vida antes da Queda, sua criação, a origem de seus nomes e assim por
diante.
Os ciclos de
conjunção de Sol e Vênus, que formam os pentagramas correto e invertido no
curso de seus ciclos de oito anos, são particularmente conectados com Astaroth,
como é a Lua Nova. Ela também é associada com estrelas particulares, incluindo
Sírius (13 57 Câncer) a Estrela de Cão
Maior. Esta estrela tem uma longa história na mitologia e magia de conjuração,
e houveram santuários de Sírius no Egito, Pérsia, Grécia e Roma. Sua pedra
preciosa é o berilo, uma pedra marítima. Suas plantas são savina, artemísia (Artemisia
vulgaris e Artemisia dracunlus). Entre os animais é associada com a língua da
cobra. Sua imagem mágica é de um cão de caça e uma jovem virgem (Anúbis e a
deusa Sothis). Astrologicamente, esta estrela é associada com sorte, orgulho,
riqueza, ambição, boa reputação, fama, honrarias, interesses ocultos, e
mordidas de cachorros. Magicamente, ela pode conferir honra e boa vontade, o
favor de homens e espíritos aéreos, dar o poder para pacificar e conciliar
reis, princípes e outros homens. Cuidado deverá ser tomado para evitar conexão
adversa com Marte, quando Sírius estiver se erguendo, pois medo de ambição
presunçosa conduzindo à acidentes ou sobre a vida de alguém.
Ela também é
associada com o grau de exaltação de Júpiter, 15º de Câncer. Conjunções da
Ascendência, a Lua, Júpiter e Vênus com este grau são todos poderosos, e podem
ser trabalhados sob seus auspícios. As estrelas dos gêmeos, Castor (18º Câncer)
e Pollux (21º Câncer) estão também sob ela. Com estas é sábio trabalhar quando
Castor estiver acima do horizonte, e Pollux ainda abaixo.
Assim também é
Procyon (24º 24 Câncer) a Estrela de Cão Menor. Sua pedra é ágata, suas plantas
as flores de cravo-de-defunto, e poejo. Sua imagem mágica é a imagem de um galo
ou de três donzelas (uma imagem de Hécate Triformis). Esta imagem pode ser
trabalhada magicamente para conferir os favores dos deuses, espíritos e homens;
ela também protege de magia maligna e preserva a saúde.
Astaroth no Oriente
Médio e no Egito
A história de
Astaroth no Oriente Médio e Egito é longa e complexa. Ela envolve milênios do
tempo, uma vasta faixa de geografia e vários grupos de linguagens, além de uma
multiplicidade de papéis. Apenas uma de suas formas mais velhas, a Inanna
sumeriana, foi chamada de deusa de muitas facetas, Inanna. Além disto, há
associações sincréticas; as deusas com quem ela foi identificada, ou quem ela
absorveu, ou quem tem qualidades absorvidas dela. Para resolver todas estas
questões complexa claramente e de forma significativa aqui é uma tarefa
impossível.
Para servir um
propósito útil, apropriado ao trabalho em mão, é o suficiente traçar a
principal linha de descendência – da Suméria ao Egito ptolomaico – e esclarecer
seus muitos papéis importantes.
Inanna sumeriana
Um papel principal de
Inanna era a fertilidade, inicialmente talvez em relação à palmeira da época,
mas estendendo-se à lã, carne e grãos. Um de seus símbolos chave em relação a
este papel era o portão do armázem. Seu mito envolvia um casamento no dia da
colheita, com seu amante, Dumuzi, que é uma forma do deus morimbundo comum aos
cultos de fertilidade da região. Esta forma de Inanna provavelmente envolvia um
de seus outros papéis chave, como uma deidade de tempestade e chuva. Neste
aspecto, o leão é – como com outras deidades da tempestade – um atributo chave.
Ele conduz uma carroça puxada por sete leões, monta um leão, ou é ela mesma um
leão. Em um de seus mitos, ela também empresta o outro animal do trovão, o
Touro do Céu, o rugir de ambos os animais era ouvido no trovão. Entre seus títulos
estão: 'Inanna, a grande tempestade do céu'. Este atributo se relaciona com seu
aspecto de fertilidade e com sua natureza belicosa. Como trovão, ela é a
'destruidora das montanhas, que fornecia asas da tempestade'. Como a chuva, sua
natureza é gentil e entregadora de vida:
Eu sigo para os céus,
e a chuva cai abaixo,
Eu sigo para a terra,
e a grama e ervas crescem.
É em seu papel de
deusa do trovão que sua natureza belicosa provavelmente se origina. Certamente,
uma das manifestações chave de Astaroth deste ponto em diante como uma deusa da
guerra com cabeça de leão, e Inanna é conhecida como deusa da guerra de mitos
muito antigos.
Outro papel chave de
Inanna é uma deusa de Vênus como Estrela da Manhã e Anoitecer. O interessante
neste aspecto é que, nesta forma, a deusa mantém corte na Luas Novas para ouvir
petições daqueles em aflição. Como Estrela do Anoitecer, ela também julga o
justo e o injusto. Como a Estrela da Manhã representava trabalho produtivo,
então a Estrela do Anoitecer representava descanso e recreação, e outro papel
chave de Inanna segue disto: Inanna, como meretriz, deusa da música e da dança,
a protetora das prostitutas e das cervejarias. A Estrela da Manhã, por outro
lado, era também associada com ela como deusa da guerra, um simbolismo de
surpreendente ampla distribuição entre as pessoas de descêndencia asiática.
Implícito em seu papel belicoso, está uma ligeira inferência de ver ideias de
punição e vingança, seguindo-se em seus julgamentos.
Todos estes papéis
são encontrados na Ishtar acadiana (e em geral semítica) Ishtar, com Inanna foi
identificada. O nome Ishtar deriva – através da forma intermediária de Eshtar –
daquela de Attar, o nome de um deus semítico do Oeste de Vênus como Estrela da
Manhã, e da chuva. Como sua contraparte feminina Astarte (a forma mais velha é
Attart, a forma feminina do nome masculino), ela representava Vênus como
Estrela do Anoitecer, bem como chuva, guerra e amor sexual. Estas são somente
as qualidades principais da deusa, da qual a natureza multi-facetada possui ao
mesmo tempo uma unidade permanente de caracterização.
Há certamente outras
complexidades que estão no presente além da resolução dos estudiosos mais
profundos. Por exemplo, a natureza precisa de seu relacionamento com a deusa
Anath, e com Asherah, ainda não foi discernida. O que importa aqui é que o
princípio do símbolo de Asherah, o mastro cerimonial que traz seu nome, é
também associado com Astarte. Este símbolo importante é também o posto sagrado
de Inanna. Como Astarte ou Ashtoreth, ela era a deusa principal dos fenícios e
canaanitas semíticos. Sob o nome de Tanit, ela também era a deusa principal da
colônia fenícia de Cartago, que trazia todos os mesmos atributos.
Os mistérios de Ísis
e Osíris é o título de um importante trabalho de Plutarco, do qual muito de seu
conhecimento daqueles Mistérios é derivado, e cujo estudos de monumentos e
papiros têm somente se estendido. A história é familiar o suficiente, e somente
alguns detalhes interessam este estudo. Quando Set prende Osíris numa arca e a
lança no Nilo, ela é carregada pra longe pelo rio, até o mar, chegando na costa
novamente em Biblos. Biblos era uma cidade fenícia extremamente antiga, e o
centro de adoração de Tammuz, uma forma do deus morinbundo, semelhante ao
Dumuzi, o amante de Inanna. Os gregos adotaram os ritos de Adônis daqui tão
cedo quanto o 7º século a.C., o nome Adônis sendo derivado da palavra fenícia
Adon, significando Senhor.
Na história egípcia,
Ísis persegue a arca até Biblos, onde uma impressionante árvore tamargueira
cresceu rapidamente em volta dela e foi removida como um pilar para o palácio
da Rainha Astarte e seu marido Melkarthus (Melqart, outra importante deidade
fenícia, chamado pelos gregos de Hércules Celestial). Que estas duas figuras
são tão divinas quanto Ísis, ou somente tão humanas quanto ela, isso é certo. É
também extremamente provável que esta parte da história explique a relação
entre os mistérios de Ísis e Osíris, e aquelas da deusa semítica e seu consorte
morimbundo. É, de fato, extremamente provável que um trocadilho estendeu a
palavra biblos (inicialmente uma referência ao papiro completamente egípcio do
pântano; papiro sendo do qual papel, e portanto livros ou bíblias, são feitos),
à cidade fenícia. A árvore tamargueira é mencionada nos lamentos babilônicos
para o deus:
Uma tamargueira que
no jardim não bebia água,
da qual a coroa no
campo brotava nenhuma flor.
Uma versão deste mito
é de que Ísis não levou de volta o corpo de Osíris para o Egito, mas que ele
foi enterrado em Biblos e foi em sua honra que o festival de Adônis foi
mantido. É muito evidente que as religiões semíticas e egípcias tem um ponto
mútuo de influência uma sobre a outra. Em particular, a importância de Astarte
e Baal no Egito influenciou os ritos de Ísis e Osíris; muita coisa, como a arte
egípcia, influenciou o retrato dos deuses semitas em seus lares originais. As
lamentações de Astarte por Adônis ou Ishtar por Tammuz eram pouco diferentes
daquelas de Ísis por Osíris na obra obsoleta, mas ainda útil, de Frazer, Golden
Bough.
Embora esta conexão
seja extremamente significante, esta não é a única aparência de nossa deusa na
religião e história egípcia. A adoção da deusa da guerra semita de cabeça de
leão Ashtoreth, pelos egípcios, ocorreu provavelmente por volta de 1800 a.C.
Sob os nomes Asthertet ou Astharthet, ela foi fortemente associada com o uso do
cavalo e carroça na guerra, que os egípcios não possuíam antes do que essa
época. Seu culto persistiu desde então, através do período ptolomaico, e no
começo da era cristã. Como uma deusa do amor, ela foi identificada como Hathor
ou Ísis-Hathor, em uma ou mais de suas formas. A importância do mastro ou pilar
no culto de Hathor é também atestada. Como uma deusa da guerra, Asthertet, foi
identificada como a deusa Sekhmet. Ela foi também associada com a Lua e chamada
'senhora dos cavalos, dama da carruagem, habitante de Apollinopolis Magna';
(Behutet para os egípcios, o Edfu moderno, assento da adoração de Hórus de
Behutet, conhecido no ocultismo moderno como Hadit). No lendário conflito entre
Set e Hórus, Asthertet e Anath são dadas
como esposas para Set a fim de aplacá-lo para os termos de um estabelecimento
de paz que favorece Hórus. Note também que Set foi cônjugue de Taurt, a mais
antiga e popular das deusas mãe no Egito, bem como Neptís, a mãe de Anúbis.
Astarte no
Mundo Grego e
Romano
Como visto, a assimilação de uma deusa com
outra, de uma nação à outra, foi um aspecto primordial da religião no Oriente
Médio. Este processo acelerou com as conquistas de Alexandre, e por todo o
período helenístico. Com a ascensão do Imperio Romano, o processo acelerou
ainda mais, na combinação sincrética e na disseminação das religiões orientais
na Europa. Astarte, Artêmis e Ísis se tornaram identificadas uma com a outra e
com outra deusa, tal como Afrodite; que tinha de fato se originado no Leste ao
invés da Grécia; e com igual justificação foi identificada com Cibele e Rhea.
Como a Deusa Assíria, ou Dea Síria, a adoração de Astarte se espalhou por todo
o Império, rivalizada somente por aquela de Ísis, com quem em qualquer caso ela
foi fortemente associada. Seu status, em conformidade, no início da era cristã,
de onde ela declina ao status de um demônio de gênero questionável, poderia
dificilmente ser maior.
Astaroth e
Hécate
"Pelos mistérios do profundo, pelas
chamas do Banal, pelo poder do Leste, e o silêncio da noite, pelos ritos
sagrados de Hécate, eu conjuro e exorciso-te... espírito de N. Falecido, a
responder minhas suseranas demandas, sendo obediente à estas cerimônias
sagradas em dor de perpétua tormenta e aflição: BERALD, BEROALD, BALBIN GAB
GABOR AGABA: Levante, levante, eu te encarrego e te comando."
The Discoverie of Witchcraft, Scot, 1665.
Hécate é uma figura importante na história da
mágicka e da bruxaria. Ela foi uma figura misteriosa na região do Olimpo, sendo
a única dos Titãs (as deidades Ctônicas anteriores) a reter seu poder e posição
sob o novo regime de Zeus, o líder dos olimpianos pós-ctônicos. Ela foi honrada
por todos os deuses, e identificada com Selena ou Luna no céu, Artêmis ou Diana
na terra, e Perséfone ou Proserpine nas regiões abaixo, o precursor de nosso
Inferno. No Papiro Mágico, Hécate é também idêntica com Selena, Artêmis e
Perséfone (veja PGM IV. 2523-2621, PGM IV. 2708-2784, PGM IV. 2815-2817, etc),
e seu domínio universal levou ela a ser considerada a Alma do Mundo dos
hermetistas caldeus, diretamente análogo à Ísis como Anima Mundi no ocultismo
da Renascença.
Como uma deusa tripla, ela é muitas vezes
descrita como tendo três corpos, ou três cabeças: no começo do período
clássico, estas são cabeças humanas, depois ela é vista com cabeças animais,
como Mestra das Bestas. Ela pode ser encontrada com as cabeças de um leão e uma
égua, e a de um cão ou javali; no Papiro Mágico, outras variações ocorrem: em
PGM IV. 2120-2123, ela tem a cabeça de uma vaca no lado direito, a cabeça de um
cão feminino no lado esquerdo, e a cabeça de uma garota no centro; em PGM IV.
2881-2884, ela tem a cabeça de uma cabra do lado direito, um cão feminino no
lado esquerdo, e no meio aquele de uma garota com chifres. Suspeita-se
ocasionalmente que o Cerberus de três cabeças era uma forma não-humana de
Hécate mais velha. Isto é reforçado por descrições alternativas de Cerberus cem
cabeças, como Hécate é, aparentemente, relacionado à palavra grega para cem,
hekaton.
Sua forma tripla leviu ela a receber os
títulos: Diva Trifomis, Tergemina e Triceps. Cães, cordeiros femininos negros e
mel eram oferecidos a ela nas estradas e onde três estradas se encontram, daí
seu títlo Trivia ou três-caminhos, e nas encruzilhadas. As encruzilhadas, em
muitas tradições, representam um lugar entre os mundos, especificamente os
mundos dos mortais e dos imortais. Em troca de tais oferendas, ela poderia
carregar mensagens de lá para cá entre estes mundos, e como um poder de
justiça, ela poderia interceer com eles.
Os atenianos a consideravam uma patrona de
famílias e de crianças (seu título como educadora dos jovens era Kourottophos),
como também do pobre e indefeso, em geral. Suas estátuas eram muitas vezes
conformementes encontradas na entrada da casa (como guardião do limen, a
entrada, ela era Limenoskopos; um título relacionado é Propilaia, Aquele
perante o Portal). As formas mais antigas da imagem dela, se nas encruzilhadas
ou na portaria, consistiam-se de um mastro – como mostrado por Rabinowitz – é
retido até mesmo em santuários posteriores. Sobre ele ficavam penduradas suas
máscaras, geralmente três em número.
Na Lua Nova – que, como visto anteriormente, é
o tempo em que Inanna mantinha corte – era o costume das pessoas mais ricas
fornecer uma festa e reunir-se nas ruas ao pobres. Posteriormente, como parte
do rito, estes beneficiários do costume regularmente registravam que Hécate
tinha devorado a festa. Nesta época, muitas oferendas expiatórias eram feitas,
para aplacar a deusa por qualquer mal feito que pudesse influenciar o público
bom. Isto novamente é reminiscente da corte de Inanna, onde ela julgava o
culpado e inocente de acordo com seus feitos; como Hécate, ela possuía autoridade
para julgar, e para recompensar ou punir. Tão grande era seu poder que ele se
entendia por terra e mar, os céus e o submundo, e reis e nações creditavam-na
com qualquer prosperidade que eles pudessem possuir.
Ela participou ativamente na busca pela filha
de Deméter, Perséfone, depois de sua abdução por Hades, e se tornou sua
constante companheira até sua descoberta. Esta conexão mítica reforça
fortemente a conexão dela com o reino dos mortos, que na época corroeu suas
associações mais positivas, como geralmente ocorre com figuras ctônicas sob
influência de religiões mais civilizadas. Portanto, no texto cristão gnóstico
Pitis Sophia, ela é mencionada como a seguir:
A terceira ordem é chamada de Hécate de tripla
face, e há sob sua autoridade vinte e sete arquidemônios, e são eles que entram
nos homens e os seduzem aos perjúrios e mentiras e a cobiçar aquilo que não
pertence a eles. As almas que Hécate trouxe daí em arrebatamento, ela conduziu
sobre seus demônios que pairam sob ela, a fim de que eles possam atormentá-los
através de sua fumaça obscura e seu fogo maligno, eles sendo excessivamente
afligidos através dos demônios. E eles gastaram cento e cinco anos e seis
meses, sendo castigados na punição maligna dela; e eles começaram a ser
dissolvidos e destruídos.
Em seu papel como deidade do submundo no período posterior pagão, ela
era uma figura grande e formidável. Ela era capaz de liberar sobre a terra todo
o tipo de assustadores demônios e fantasmas, era a deusa da feitiçaria e
bruxaria, habitando nos lugares onde as estradas se cruzam, ou em cemitérios e
perto das cenas de crimes violentos. Este último aspecto aponta para seu papel
anterior em administrar justiça divina, mas é aqui assimilada aos desejos dos
mortos por sangue, a fim de recuperar sua velha força. Ela própria perambulou
com os mortos, e sua abordagem doi anunciada pelo latir dos cães.
Antes da degeneração da deusa numa figura de
somente medo, seu envolvimento com Démeter e Perséfone fizeram dela uma figura
de grande importância nos Mistérios de Elêusis. Assim também nos mistérios
samotracianos e outro mais. Na Iniciação dos Submundos, ela não guiava os
mortos, mas inicia. Como Hermes, o mais importante de seus papéis era aquele do
guia e do iluminador, Hécate Psicopompos, a guia das almas, Hécate Soteira, a
deusa salvadora. Sua tocha, referida nos grimórios como 'As Chamas de Banal',
guiava iniciados através do Submundo e fornecia uma catarse ritual, pelo qual
eles eram transformados e regenerados.
Os Oráculos Caldeus de Zoroastro são
provavelmente greco-egípcios por origem, mas influenciados por fontes
zurvanistas-caldeias hermeticamente inspiradas. Em sua profundamente filosófica
cosmologia mágica, o pepel de Hécate de intermediária divina foi desenvolvido
ao extremo âmbito. O Oráculos retrata Hécate preenchida e dispensadora do fogo
entregador da vida:
...o Fogo Trazedor da Vida... preencheu o
peito produtor de vida de Hécate... [Ela] tendo recebido os poderes de todas as
coisas em Seu Âmago Inefável, emana geração perpétua em todas as coisas.
Por causa de ela receber e manter dentro de
seu peito, e transmite adiante o 'Fogo Trazedor da Vida', ela é para estes
iniciados a deusa extrema, não meramente da geração, mas da regeneração
espiritual.
Esta teologia ígnea, incidentalmente, é
idêntica (se não em fonte, por inspiração) ao expressado na Oração das
Salamandras pelo qual Astaroth é conjurado na assim chamada Cabala da Borboleta
Verde no Grimório Verdadeiro. A 'Filosofia do Fogo' dos Oráculos é aquela
desposada pelo herói titular do Le Comte de Gabalis. Nesse sentido, pelo que
podemos ser apurados, essa mesma oração se origina, e além dela estão várias
citações diretas dos Oráculos, que a própria oração ainda pode provar ser.
Muito do saber do número e da estrela do
Gnosticismo também se origina nos sistemas da Babilônia e da Caldeia. Aí também
um aspecto central das seitas gnósticas se deriva. O casamento místico de
Sophia e seu noivo celestial é um descendente direto de Ishtar e Tammuz, recriado
na terra pelo sacerdote e sacerdotisa num relicário conhecido como câmara do
casamento. Para os sumérios e as culturas imediatamente descendentes deles,
este ritual era uma garantia de vida através da fertilidade das colheitas e
rebanhos. Pode certamente ter tido uma significância mais esotérica da Caldeia
e da Babilônia antes dos gnósticos, mas se ou não isto foi feito, com os
gnósticos foi uma garantia não da fertilidade, mas da salvação, do retorno à
fonte celestial de vida. Este rito foi desempenhado pelos gnóstivos valentianos
no 14 de Fevereiro. Tão potente era o apelo deste rito que a Igreja teve de
inventar um São Valentim martirizado naquele dia para combater sua influência.
Consequentemente, o Dia de São Valentim é um testamento para a influência do
Gnosticismo, e de Astaroth, que sobreviveu por séculos. É também surpreendente
que Sophia – a deidade gnóstica da Sabedoria – possui várias qualidades
originando-se com Ishtar e Astaroth, não menos meretriz divina entre elas.
Em muitos aspectos, a natureza de Astaroth,
como desenvolvida nas tradições mágicas, é similar ou idêntica com aquela da
Deusa Hécate. Há, com certeza, um golfo entre algumas retratações de Inanna ou
Ishtar – que em algumas formas se assemelha à uma obstinada e egoíta jovem aristocrata
– e Hécate, da qual a empatia com os marginalizados e indefesos é permanente.
Entretanto, as qualidades positivas de Hécate não estão ausentes das
retratações de Astarte como intercessora, protetora e distribuidora de justiça.
Não somente era Hécate similar em natureza e
origem com Astarte, mas no período antigo, ou mais recentemente, elas também
desenvolveram papéis muito similares na magia. Elas são muitas vezes invocadas
nas encruzilhadas, elas comandam numerosos espíritos, elas são ambas associadas
com Cerberus, ou Nebiros, elas tem uma natureza lunar, o leão e o cavalo
pertencem a ambas, e o mastro ou pilar é seu símbolo comum.
Dada as antigas conexões traçadas por Hécate e
Artêmis por um lado, e Artêmis e Astarte por outro, uma ligação similar de
Hécate e Astaroth na tradição mágica – com uma dando nome à outra – é
prevísivel.
Esta conexão pode ser percebida em operação no
Testamento de Salomão. Aqui 'os laços de Artêmis' são prognosticados (pela
sétima das Plêiades, presumivelmente Alcione) a ser causa extrema da queda de
Salomão. Similarmente, na Bíblia, é Astaroth, da qual a adoração supostamente
conduz à queda de Salomão (1 Reis, II, 6.), enquanto no Papiro Mágico
contemporâneo com o Testamento, Artêmis é totalmente identificada com Hécate. O
mesmo texto fala dos eventos mais sinistros nas encruzilhadas, usando termos
que podem facilmente se referir à Hécate, tal como seu título Enodia.
É um fato notável que um amuleto do período
romano fosse descoberto numa encruzilhada na Óstia, retratando em um lado o Rei
Salomão, mexendo num caldeirão mágico, e no outro lado a forma de três corpos
de Hécate, ambas as figuras cercadas por símbolos mágicos, dos quais alguns são
reconhecíveis nos grimórios salomônicos.
Embora algumas associações modernas entre
antigas deidades e espíritos sejam muito tênues, particularmente em relação às
praticalidades mágicas, esta associação é muito próxima e também eminentemente
prática. É prático num sentido mágico e cosmológico. As antigas associações de
Hécate transferem-se muito prontamente à Astaroth em nossos próprios tempos.
Embora o papel de Hécate pareça a diminuir gradualmente após um período
medieval, o mesmo papel é desempenhado por Astaroth, e aumenta uma proporção
inversa conforme aquela de Hécate diminui. Voltando ao Papiro Mágico, nós
também vemos um possível análogo ao gênero agitando na natureza de Astaroth na
natureza de Hécate. Isto está na fusão mágica das ideias em relação à Hécate
como Deusa das encruzilhadas e Hermes como Deus disso. No Papiro Mágico, e de
fato há muito tempo antes, uma notável partilha de atributos pode ser vista
entre estas deidades mensageiras, para que, por exemplo, Hécate fosse retratada
com o caduceu de Hermes. Este foi de fato um aspecto há muito tempo
estabelecido da mitologia grega e dos cultos de Mistério dos quais muito da
magia do Papiro é derivada; por exemplo, aquela do Idaean Dactyls. Além do nome
mágico de Hermecate – uma combinação de seus nomes – aparece no papiro. Dada
esta qualidade permutável, não é improvável que uma flexibilidade de gênero se
resultasse. Isto pode por sua vez ter complicado a figura parcial resultante do
declínio da tradição mágica e a perda de muito de seu saber original.
Entre as perdas na antiga mitologia que
poderiam esclarecer nossa compreensão é ser somado as persistentes, mas
incompletas, conexões da lenda de Perseu e Andrômeda com Astarte e Hécate. Por
exemplo: Hécate é chamada de Perseis ou Persa, e o nome daquela raça no mito
grego era suposta a se derivar de Perses, filho de Perseu e Andrômeda. Assim,
Hesíodo faz Hécate a filha de Perses e Asteria. Astarte, por outro lado, num
mito egípcio que infelizmente está preservado de modo muito incompleto, é
resgatada por um monstro do mar que deseja tê-la como sua companheira, por
nenhum outro do que o feroz e astuto Set; isto claramente se assemelha ao mito
de Perseu e Andrômeda. É sabido que em algumas de suas formas, Astarte era
representada como com cauda de peixe, e tinha uitas conexões marítimas (muitas
de suas imagens se assemelham com uma sereia ou Ninfa). O domínio de Hécate,
similarmente, embora muitas vezes falado como do Céu, Terra e Inferno, também
paralelos aos mundos de Zeus, Posêidon e Hades, o Céu, Mar e Submundo.
Qualquer que seja a solução para estes
enigmas, uma grande quantidade será obtida se considerar Hécate e Astaroth
similares por natureza, até mesmo reflexões uma da outra. É distintamente para
nossa vantagem considerar Hécate como uma manifestação mais elevada de
Astaroth. Dessa forma, nós aumentamos nossas opções mágicas. Nós podemos
certamente conjurar Astaroth por meios da forma adaptada do Grimório;
entretanto, nós também temos a opção de realizar uma invocação divina de
Hécate. Então, através de identificar nós mesmos com ela, com sua autoridade
Astaroth pode ser convidada a aparecer como uma hipóstase.
O
Gênero de Astaroth
A retratação de Astaroth como
entidade masculina na Goetia de Salomão é um erro que parece se originar nas
traduções dos escritos de Weyer (o original latim não contém referências a
gênero, que aparecem somente na versão inglesa, o uso de ele na tradução é
primariamente uma formalidade). Scot, que estava usando uma transcrição muito
defeituosa em inglês, involuntariamente imitou este erro; das referências à
Astarte em seus próprios escritos, é improvável que ele teria feito isso de
outra maneira. De ambas estas fontes, isso encontrou seu caminho nos grimórios,
que contrários à imaginação popular, são basicamente compilações posteriores. O
erro foi frequentemente realçado por escritores posteriores, e até mesmo
satirizado pelo arguto autor Colin De Plancy, que retratou o Astaroth masculino
se casando – ou talvez se reunindo com – uma Deusa da Lua Fenícia (Astarte).
Esta mesma identidade foi evidentemente conhecida para Eliphas Levi, no qual
alegado fragmento da Chave de Salomão aparecem as palavras:
O Chefe ou Guia destes Demônios é Astaroth ou
Astarte, a Vênus impura dos assírios, que eles representam com a cabeça de um
asno ou de um touro, e os seios de uma mulher.
Todavia, a incorporação de detalhes derivados
de Weyer e Scot nos influentes grimórios têm infleizmente perpetuado o erro até
os dias atuais.
Em alguns aspectos, entretanto, isto não é
importante, já que deidades canaanitas ocasionalmente passam por misturas de
gêneros em seus contextos originais. Também, os planetas Mercúrio e Vênus
frequentemente tem pares femininos/masculinos de deidades associados com eles,
personificando formas da Estrela da Manhã e do Anoitecer daqueles planetas. De
fato, a Athtar canaanita, a forma masculina do nome do planeta Vênus, é a
origem da forma feminina do nome. Portanto, o gênero de Astaroth numa ocasião
particular pode ser determinada pela posição de Vênus em relação ao Sol. Como
um entidade masculina, quando Vênus se ergue perante o Sol, e como uma entidade
feminina quando Vênus se ergue por trás do Sol. Entretanto, já que os pares
feminino-masculino não são um aspecto constante da identidade de Astarte, é
igualmente provável que ambas as formas sejam femininas.
Muitos magistas modernos (do renascimento
ocidental especificamente) insistem que a identidade de Astaroth, o demônio, e
Astarte, a deusa, não devessem ser colocados em prática. Seus argumentos são
algumas vezes difíceis de compreender, e aparentemente consistem-se de tratar a
forma exata dos grimórios como de alguma maneira sacrosanto: más traduções,
omissões, erros e tudo o mais. Ao fazer isso, eles ainda reservam a
identificação de deidades pagãs com demônios por antigos autores cristãos – dos
quais o problema inteiro se origina – bem como a mesma identificação por
estudantes profundos do oculto, e na mais ampla cultura e literatura. Por
exemplo, Robert Turner, que no século 17 traduziu muitos dos grimórios em
inglês, identificou claramente os 'diabos' com seus homônimos pagãos; não como
aproximações, mas como um e o mesmo. Assim também fez Milton, em seu poema
épico, Paradise Lost.
A posição destes tradicionalistas modernos
pode ser baseada em sua percepção das praticalidades – que o demônio é melhor
tratado via os grimórios, e a deusa, por recurso, às formas pagãs religiosas.
Entretanto, deusas com papéis e domínios ctônicos sobre o Submundo são
frequentemente encontrados nos grimórios e nas fontes mais velhas que estão por
baixo deles, tais como o Papiro Mágico. A distinção, portanto, embora talvez
claras o suficiente para abordagens puristas aos grimórios específicos,
certamente não se aplica quando abordando Astaroth como uma deidade ctônica ou
do Submundo.
Desnecessário dizer, tal abordagem também
envolveria uma retirada do formato de grimório comum.
Deve ser mantido em mente
que a demonização gradual da religião ctônica esteve em processo de avanço, nas
culturas grega, romana e semítica, entre outras. Consequentemente, uma
regeneração neo-ctônica destas figuras em nossa época é inteiramente
justificada, independente de seu papéis dentro da cultura demonizadora.
Quaisquer intérpretes inteligentes e responsáveis dos grimórios deveriam ser
capazes de ver que isto é exatamente o que está acontecendo aqui. A
identificação de uma deidade demonizada com a original é portanto teoricamente
e historicamente correta, conquanto que uma esstrutura ritual e cosmologia
apropriadas sejam empregadas. Em outras palavras, se como resultado deidades
antagonistas da teologia possam ser transformadas em demônios, pela força de
uma perspectiva mais compátivel o processo possa ser revertido.
O sincretismo brasileiro de deuses, espíritos
e demônios da cultura ocidental com seus Exus e Pomba Giras, tem outro meio de
resolver esta dificuldade aparente: Astaroth (o demônio masculino) é associado
com Exu Rei das Sete Encruzilhadas; Astarte (a deidade feminina) é associada
com Pomba Gira Rainha das Sete Encruzilhadas.
Esta abordagem eminentemente prática e mágica
ao problema tem muito a recomendá-la. É o que nós podemos esperar de uma
tradição viva ao invés dos melhores esforços de um renascimento oculto
divorciado de suas raízes. O magista individual deveria cautelosamente
considerar estes aspectos e encontrar sua resposta através da esperiência
prática. Ter em mente que não é necessariamente certo ou errado e nem as
condições astrológicas em vigor na hora da operação que possam determinar qual
das duas formas aparece. Isto é uma consideração mágica, e portanto digna de
atenção séria. Em tempo, o magista se tornará ciente de que formas e
preferências os espíritos demonstram no relacionamento que eles desenvolvem
juntos, e é isso o que realmente importa.